Um desafio do mundo corporativo é ter uma governança entre todas as partes interessadas no seu negócio. Assim, também é para os governos, pois é muito comum ocorrerem conflitos dentro das “pastas” responsáveis pelo funcionamento da engrenagem que faz o Estado “rodar”, sendo o foco do gestor minimizar os custeios e maximizar os recursos para investimentos objetivando dar eficácia no atendimento da sociedade.
Em artigo produzido para o Blog do Elimar Côrtes, o coronel da Reserva Remunerada da Polícia Militar do Espírito Santo Leonardo Marchezi dos Reis faz uma reflexão sobre quem são efetivamente os “stakeholders”, ou, numa definição mais direta, “as partes interessadas” que compõem a governança em segurança pública e leva o leitor a perceber que o maior conflito existente entre elas está no reconhecimento do papel que cada um tem, quando não conseguem priorizar suas ações pensando no resultado para o seu principal acionista que é o cidadão.
Abaixo, a íntegra do artigo.
Fontes Filho (2003) e Pereira (2010) entendem que a governança nas organizações públicas e privadas apresentam semelhanças, pois tem princípios básicos comuns para seguirem, tais como a transparência, equidade, cumprimento de leis, prestação de contas e conduta ética, além da separação da propriedade da gestão.
O que motivou criação de uma governança foi a existência amplamente percebida do conflito entre, inicialmente, os gestores e os proprietários das empresas. Marques (2007) afirma que a governança corporativa é um conjunto de regras que visam minimizar os problemas de agência. O foco inicial foi a relação conflituosa entre os gestores e os acionistas. Evoluiu e ampliou seu campo de ação, sendo aproveitada também nos conflitos entre os diversos stakeholders de uma firma: gestores, empregados, clientes, governo, acionistas, etc. (KUNZ e PFAFF, 2002)
Freeman (1984), definiu stakeholder como sendo o indivíduo ou grupo de indivíduos que pode afetar, ou ser afetado, pela realização dos objetivos de uma organização. A simplicidade do conceito adotado não retrata a complexidade de bem definir e principalmente priorizá-lo, de tal forma a ser usado com equidade para com todos os stakeholders. Acrescenta o Instituto Ethos (2009) que a tendência é de se considerar stakeholders quem assim se julgar ser, o que permite outro olhar conceitual.
Freeman, Wicks e Parmar (2004) afirmam que a Teoria dos Stakeholders pretende ajudar no embate sobre quais stakeholders devem ser priorizados, com quê propósitos e como fazê-lo, ou seja, como gerenciar os stakeholders num contexto do gerenciamento estratégico das empresas. Esse é um ponto, por exemplo, que deve ser enfrentado no atendimento de emergência e urgência de Segurança Pública, pois a demanda integral de interesses de seus stakeholders (sociedade) é impossível de ser atendida pelo sistema operacional existente para essa atividade. O gerenciamento dos stakeholders é um tema de gestão estratégica (FREEMAN, WICKS e PARMAR, 2004 apud FREEMAN,1984).
Lidar com o bem público é muito mais complexo comparado ao segmento privado, pois, em muitos momentos não está claro quem é o proprietário e o gestor. Se estabelecermos que o proprietário é a sociedade (cidadãos, setor privado, etc) e o gestor é o político (quem nomeia para os cargos comissionados, funcionários públicos, etc), observaremos uma perspectiva infinita de que o conflito não terá solução fácil, tamanha são as relações de poder que separam a sociedade da gestão.
No sentido de ampliar a visão conceitual, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC, 2009) define que Governança “é o sistema pelo qual as organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre proprietários, Conselho de Administração, Diretoria e órgãos de controle. As boas práticas de Governança convertem princípios em recomendações objetivas, alinhando interesses com a finalidade de preservar e otimizar o valor da organização, facilitando seu acesso a recursos e contribuindo para sua longevidade”.
Uma tentativa de diminuir esse conflito no setor público se deu quando alguns gestores (políticos) decidiram trazer a população para participar do orçamento público, definindo onde desejavam que os recursos fossem empregados. Desta forma, na governança pública instalava um sistema de planejamento participativo, necessitando a seguir, incluir um sistema de accountability entre o executivo, o legislativo e a sociedade. (MARQUES, 2007)
Para Marques (2007) não importa como a estrutura de governança é utilizada, para que seja boa aos setores públicos e privado são requisitos: “uma clara identificação e articulação das definições de responsabilidade; uma compreensão real dos stakeholders da organização e outros interesses para controlar os seus recursos e dividir resultados; e sustentação da gestão, particularmente no nível superior”.
A autora cita que para ANAO (Autralian National Audit Office) existem seis passos fundamentais para uma efetividade da governança no setor público, sendo três de qualidade pessoais que todos da organização devem ter como: a liderança, a integridade e o compromisso. As outras três qualidades são a transparência, a responsabilidade e a integração, pertencentes às estratégias e políticas da organização.
Fica evidente que essas seis qualidades presentes torna a governança no setor público efetiva deixando os cidadãos esperançosos com suas autoridades delegadas, pois terão a certeza da prestação de contas, princípio presente no accountability e na responsabilidade a quem confiaram a gestão dos recursos como stakeholders. (PEREIRA, 2010). Assim os gestores poderão controlar melhor os riscos de sua administração pública e atender melhor as partes interessadas.
Proença Jr, Muniz e Poncioni (2009) questionam o accountability, temendo a perda de sua instrumentalidade para a governança, pois afirmam não bastar a sua existência, pois por si mesma pode perder o sentido para a governança. Os autores se inquietam e indagam que “a questão não é qual governança de polícia [segurança pública ou defesa social] a accountability permite, mas sim qual accountability se deve ter para que se possa ter governança de polícia [segurança pública ou defesa social]”.
Qual direção seguir? Para onde devemos expandir as discussões sobre governança no setor público? As decisões dos gestores muitas vezes favorecem a si próprio. Por isso, as práticas de governança corporativa são necessárias para controlar e monitorar os gestores. (TOSI Jr, 2008)
Para Tosi Jr (2008) existem três premissas para discussão: interesses divergentes entre acionistas (sociedade) e os agentes (gestores, políticos, funcionários públicos e etc.); o gestor tem informações sigilosas, criando assimetria informacional; e os gestores são avessos ao risco.
Atender às necessidades dos stakeholders deve estar intrínseco na estratégica da organização. Priorizar os stakeholders é a forma estratégica para maximização dos benefícios produzidos, o que evidentemente se consegue, após ter bem definido o “negócio” e a função-objetivo da corporação, inspirada na moralidade, principalmente quando se trata do setor público. (AMARO et al, 2010).
Essa inquietação mesmo difusa demonstra a necessidade de se entender melhor o sistema de segurança pública e de defesa social, pois a integração é o ponto fundamental de uma governança, principalmente, no setor público e neste particular na defesa social, devendo preceder aos demais princípios, para se obter uma boa governança.
Algumas reflexões são importantes em relação à eficácia dos órgãos encarregados de prover a Segurança Pública, sob o aspecto tangível à prevenção dos crimes. Qual percentual se deve atribuir ao sistema policial sob a perspectiva de uma Governança à efetividade para prevenir o crime? Para Proença Jr, Muniz e Poncioni (2009) “o problema é a governança. Segurança é só sintoma”.
Compreender o papel da Governança para resolver os conflitos de interesse dos stakeholders, ou seja, de todos os interessados, em sua gama de atores com interesses múltiplos, pensando diferentes para atingir os objetivos, seja na visão dos Governantes, compostos por Secretarias de Estado e Municipais, Guardas Municipais, Polícias Estaduais e Federais, esses sempre vistos como protagonista pelo dever Constitucional quer seja na visão das demais partes interessadas, ou seja, a sociedade como um todo, pois não exime do direito e da responsabilidade todos os cidadãos.
Sendo assim, desenvolver um modelo de Governança em defesa social, nos seus níveis estratégico, tático e operacional, com efetividade para a produção de prevenção ao crime, transcende ao imaginário em afirmar que ações puras e exclusivas de polícia são suficientes para o estabelecimento de metas reduzidoras para um fenômeno tão complexo como a violência e a criminalidade. Cruz e Batitucci (2007, p.231-233) afirmam que “As estatísticas estão longe de revelar a verdadeira face dos homicídios cometidos no Espírito Santo, em seus mais variados tipos e motivações”.
(Leonardo Marchezi dos Reis, coronel RR da PMES; especialista em Segurança Pública; Mestre em Administração; candidato a deputado federal pelo PV)
Em artigo produzido para o Blog do Elimar Côrtes, o coronel da Reserva Remunerada da Polícia Militar do Espírito Santo Leonardo Marchezi dos Reis faz uma reflexão sobre quem são efetivamente os “stakeholders”, ou, numa definição mais direta, “as partes interessadas” que compõem a governança em segurança pública e leva o leitor a perceber que o maior conflito existente entre elas está no reconhecimento do papel que cada um tem, quando não conseguem priorizar suas ações pensando no resultado para o seu principal acionista que é o cidadão.
Abaixo, a íntegra do artigo.
Governança em segurança pública e os “stakeholders”
A governança no setor público, em particular para a segurança pública, é relativamente algo muito nova, cujas informações e instrumentos necessários são as mesmas utilizadas no mundo corporativo. Desta forma, seguiremos como base para esta reflexão a teoria do conflito, preceptora e motivadora da necessidade de uma Governança Corporativa.
Fontes Filho (2003) e Pereira (2010) entendem que a governança nas organizações públicas e privadas apresentam semelhanças, pois tem princípios básicos comuns para seguirem, tais como a transparência, equidade, cumprimento de leis, prestação de contas e conduta ética, além da separação da propriedade da gestão.
O que motivou criação de uma governança foi a existência amplamente percebida do conflito entre, inicialmente, os gestores e os proprietários das empresas. Marques (2007) afirma que a governança corporativa é um conjunto de regras que visam minimizar os problemas de agência. O foco inicial foi a relação conflituosa entre os gestores e os acionistas. Evoluiu e ampliou seu campo de ação, sendo aproveitada também nos conflitos entre os diversos stakeholders de uma firma: gestores, empregados, clientes, governo, acionistas, etc. (KUNZ e PFAFF, 2002)
Freeman (1984), definiu stakeholder como sendo o indivíduo ou grupo de indivíduos que pode afetar, ou ser afetado, pela realização dos objetivos de uma organização. A simplicidade do conceito adotado não retrata a complexidade de bem definir e principalmente priorizá-lo, de tal forma a ser usado com equidade para com todos os stakeholders. Acrescenta o Instituto Ethos (2009) que a tendência é de se considerar stakeholders quem assim se julgar ser, o que permite outro olhar conceitual.
Freeman, Wicks e Parmar (2004) afirmam que a Teoria dos Stakeholders pretende ajudar no embate sobre quais stakeholders devem ser priorizados, com quê propósitos e como fazê-lo, ou seja, como gerenciar os stakeholders num contexto do gerenciamento estratégico das empresas. Esse é um ponto, por exemplo, que deve ser enfrentado no atendimento de emergência e urgência de Segurança Pública, pois a demanda integral de interesses de seus stakeholders (sociedade) é impossível de ser atendida pelo sistema operacional existente para essa atividade. O gerenciamento dos stakeholders é um tema de gestão estratégica (FREEMAN, WICKS e PARMAR, 2004 apud FREEMAN,1984).
Lidar com o bem público é muito mais complexo comparado ao segmento privado, pois, em muitos momentos não está claro quem é o proprietário e o gestor. Se estabelecermos que o proprietário é a sociedade (cidadãos, setor privado, etc) e o gestor é o político (quem nomeia para os cargos comissionados, funcionários públicos, etc), observaremos uma perspectiva infinita de que o conflito não terá solução fácil, tamanha são as relações de poder que separam a sociedade da gestão.
No sentido de ampliar a visão conceitual, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC, 2009) define que Governança “é o sistema pelo qual as organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre proprietários, Conselho de Administração, Diretoria e órgãos de controle. As boas práticas de Governança convertem princípios em recomendações objetivas, alinhando interesses com a finalidade de preservar e otimizar o valor da organização, facilitando seu acesso a recursos e contribuindo para sua longevidade”.
Uma tentativa de diminuir esse conflito no setor público se deu quando alguns gestores (políticos) decidiram trazer a população para participar do orçamento público, definindo onde desejavam que os recursos fossem empregados. Desta forma, na governança pública instalava um sistema de planejamento participativo, necessitando a seguir, incluir um sistema de accountability entre o executivo, o legislativo e a sociedade. (MARQUES, 2007)
Para Marques (2007) não importa como a estrutura de governança é utilizada, para que seja boa aos setores públicos e privado são requisitos: “uma clara identificação e articulação das definições de responsabilidade; uma compreensão real dos stakeholders da organização e outros interesses para controlar os seus recursos e dividir resultados; e sustentação da gestão, particularmente no nível superior”.
A autora cita que para ANAO (Autralian National Audit Office) existem seis passos fundamentais para uma efetividade da governança no setor público, sendo três de qualidade pessoais que todos da organização devem ter como: a liderança, a integridade e o compromisso. As outras três qualidades são a transparência, a responsabilidade e a integração, pertencentes às estratégias e políticas da organização.
Fica evidente que essas seis qualidades presentes torna a governança no setor público efetiva deixando os cidadãos esperançosos com suas autoridades delegadas, pois terão a certeza da prestação de contas, princípio presente no accountability e na responsabilidade a quem confiaram a gestão dos recursos como stakeholders. (PEREIRA, 2010). Assim os gestores poderão controlar melhor os riscos de sua administração pública e atender melhor as partes interessadas.
Proença Jr, Muniz e Poncioni (2009) questionam o accountability, temendo a perda de sua instrumentalidade para a governança, pois afirmam não bastar a sua existência, pois por si mesma pode perder o sentido para a governança. Os autores se inquietam e indagam que “a questão não é qual governança de polícia [segurança pública ou defesa social] a accountability permite, mas sim qual accountability se deve ter para que se possa ter governança de polícia [segurança pública ou defesa social]”.
Qual direção seguir? Para onde devemos expandir as discussões sobre governança no setor público? As decisões dos gestores muitas vezes favorecem a si próprio. Por isso, as práticas de governança corporativa são necessárias para controlar e monitorar os gestores. (TOSI Jr, 2008)
Para Tosi Jr (2008) existem três premissas para discussão: interesses divergentes entre acionistas (sociedade) e os agentes (gestores, políticos, funcionários públicos e etc.); o gestor tem informações sigilosas, criando assimetria informacional; e os gestores são avessos ao risco.
Atender às necessidades dos stakeholders deve estar intrínseco na estratégica da organização. Priorizar os stakeholders é a forma estratégica para maximização dos benefícios produzidos, o que evidentemente se consegue, após ter bem definido o “negócio” e a função-objetivo da corporação, inspirada na moralidade, principalmente quando se trata do setor público. (AMARO et al, 2010).
Essa inquietação mesmo difusa demonstra a necessidade de se entender melhor o sistema de segurança pública e de defesa social, pois a integração é o ponto fundamental de uma governança, principalmente, no setor público e neste particular na defesa social, devendo preceder aos demais princípios, para se obter uma boa governança.
Algumas reflexões são importantes em relação à eficácia dos órgãos encarregados de prover a Segurança Pública, sob o aspecto tangível à prevenção dos crimes. Qual percentual se deve atribuir ao sistema policial sob a perspectiva de uma Governança à efetividade para prevenir o crime? Para Proença Jr, Muniz e Poncioni (2009) “o problema é a governança. Segurança é só sintoma”.
Compreender o papel da Governança para resolver os conflitos de interesse dos stakeholders, ou seja, de todos os interessados, em sua gama de atores com interesses múltiplos, pensando diferentes para atingir os objetivos, seja na visão dos Governantes, compostos por Secretarias de Estado e Municipais, Guardas Municipais, Polícias Estaduais e Federais, esses sempre vistos como protagonista pelo dever Constitucional quer seja na visão das demais partes interessadas, ou seja, a sociedade como um todo, pois não exime do direito e da responsabilidade todos os cidadãos.
Sendo assim, desenvolver um modelo de Governança em defesa social, nos seus níveis estratégico, tático e operacional, com efetividade para a produção de prevenção ao crime, transcende ao imaginário em afirmar que ações puras e exclusivas de polícia são suficientes para o estabelecimento de metas reduzidoras para um fenômeno tão complexo como a violência e a criminalidade. Cruz e Batitucci (2007, p.231-233) afirmam que “As estatísticas estão longe de revelar a verdadeira face dos homicídios cometidos no Espírito Santo, em seus mais variados tipos e motivações”.
(Leonardo Marchezi dos Reis, coronel RR da PMES; especialista em Segurança Pública; Mestre em Administração; candidato a deputado federal pelo PV)